30 setembro 2011

Nature Boy

Um dia uma história aconteceu. Com risos, lágrimas, gritos e segredos sussurrados num ouvido. Depois ela prolongou-se, desta vez escasseando em risos e segredos, mas fortificando todos os gritos e lágrimas. Depois parou.
Ameaçou que tinha acabado, mas voltou.
Tem sido assim desde há algum tempo.
os anos passam sempre, e acontecem sucessivamente os mesmos dias, sempre.
Quando julguei que não nos íamos repetir mais porque os círculos utópicos não são eternos, enganei-me.

1, 2, 3... e tu estavas aqui.
1, 2, 3... as tuas asas cortaram o mundo no regresso ao sítio de onde vieste ver-me.
o nosso dia deste ano passou, e eu espero querer que o próximo ano não conte os dias como eu conto os teus quilómetros.

1, 2, 3... quando?
tenho um corpo colado ao meu, que não é o teu, e por alguma razão, isto não me parece natural.
3, 2, 1... amo-te.
não te preocupes em enviar uma carta. podes responder-me no ano que aí vem.

1, 2, 3...

18 setembro 2011

Last of English Roses

Querida muralha,

eu sei que nunca fomos muito próximos. Nunca fomos melhores amigos, nunca falámos sobre tudo, mais alguma coisa e ainda mais um bocadinho. Não. Sempre desejámos um bom dia mútuo pela manhã (pelo menos naquelas em que nos cruzávamos), tentámos sempre ter conversas de conveniência - o que frequentemente conduziu a momentos perfeitamente embaraçosos e dispensáveis. Se bem que eram esses momentos os únicos em que se podia sentir a comunicação perfeita entre nós.
Talvez o sangue pouco mais não seja do que isso mesmo, talvez o amor e a pele não sejam mais que isso também: palavras, termos. Inconsistentes e sem qualquer significado especial. Mas eu já me tinha acostumado, e embora não estivesse conformado, estava bem por poder ao menos manter contigo aquela disputa amigável de palavras, daqueles jogos com poucos ataques e muitas defesas porque é essa a única táctica com que me sei guiar, tendo em conta o adversário.
Depois tudo mudou. Houve um dia em que ninguém se saudou, e a esse dia seguiu-se outro em que a casa foi ficando mais vazia, até ficar o que vejo hoje: paredes brancas que não reflectem tudo o que já aqui aconteceu.
Toma bem conta dela, com todas as tuas pedras e com toda a tua protecção. Guarda-a porque ela é tudo para mim, e é ela o elo que me liga a ti, é o laço do nosso sangue e sem ela somos só uma análise, um grupo sanguíneo e uns tantos cromossomas. É por ela que eu te vejo e por mais que as nossas conversas sejam quase inexistentes e com uma grande lacuna em termos de interesse, existem.
Eu sei que agora vai ser tudo diferente, e eu tenho que me safar como conseguir. É a selva, são os leões do mundo real - aquele mundo feio - de onde ela me protegeu até hoje. Já não há muralha, nem bolha, nem nada que me possa afastar dele agora. Os olhos têm que ser abertos, as coisas têm que ser feitas e a vida tem que ser vivida da melhor maneira que eu souber. É a prova de fogo que a minha água sempre esperou.
Eu estou pronto.
Estou pronto, sim. Estou pronto para deixar as tuas fronteiras e para romper a bolha protectora. Estou pronto para crescer e dar esse passo.
Mas por favor, por favor, por favor, Muralha. Guarda-a contigo, a minha bolha. A coisa mais importante desta vulgar vida. O ponto alto, que me trouxe aonde eu estou, que deu ao mundo como bebé e me transportou por dezassete anos. Protege-a.
Porque mesmo estando longe, mesmo estando a crescer, mesmo estando a construir o meu refúgio no meio da selva dos leões, eu quero saber que tenho uma bolha para me dar um dia da sua transparência segura e para me dar um sonegado empurrão de volta à luta pelo descanso eterno, e só conseguimos descansar depois de nos cansarmos o suficiente.

Até Breve, a ti, Muralha.
Dá um beijo à Bolha por mim, diz que a vejo em breve como prometi.
Ao Armário, um abraço.. E não o deixes esquecer que mesmo no pólo oposto, continuo a gostar dele.

Vou ver-vos em breve e com um sorriso. Não quero encontrar-vos num pranto colectivo por falta de um.
Ouvi dizer que as bolhas nunca rebentam, achei por bem acreditar nisso.
Adeus.

P.S - Nunca cheguei a perceber, Muralha, se estou dentro ou fora das tuas fronteiras. Tu sabes? Apesar de tudo gosto muito de ti.